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Volume editado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais cita trabalho realizado no Da Vinci
09/12/2003 · por Ana Cláudia e Victor Humberto

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais editou volume denominado JURISPRUDÊNCIA MINEIRA, cujo Volume 164 – abril a junho de 2003 – ano 54, com 784 páginas, traz artigo escrito pelo Desembargador Luiz Carlos Biasutti, com o título CENTENÁRIO DE UM ROMANCE SOBRE A JUSTIÇA. Trata-se de resumo do romance CANAÃ, de Graça Aranha, e considerações sobre “O crime conforme o processo”.

"Jurisprudência mineira" cita trabalho desenvolvido no Da Vinci
Toda a descrição do desenrolar da acusação, julgamento e sentença estão contidos no TRASLADO DOS AUTOS, de 1891, com o qual alguns alunos Da Vinci vêm lidando em situações diversas. O primeiro contato dos alunos com o Traslado aconteceu na Viagem Acadêmica às Três Santas com a turma do 1º I1, em 2002.. A seguir, os alunos levaram a peça (com 111 anos) ao Arquivo Público Estadual, onde receberam instruções sobre a conservação e, depois de realizarem cópias que foram enviadas ao Instituto Histórico do Espírito Santo, ao Instituto Histórico de Santa Teresa, ao Desembargador Luiz Carlos Biasutti e ao Fórum de Santa Leopoldina, entregaram ao Juiz de Santa Leopoldina o original devidamente embalado e cópias que deverão estar disponíveis para manuseio pelos pesquisadores e estudiosos sobre o assunto. Clique aqui para ver matéria “O Canaã – Romance e Realidade” .

O romance, primeiro best-seller brasileiro, que completou 100 anos em 2002, foi tema de estudos dos alunos dos 1os anos de 2003. A partir da leitura foram desenvolvidos diversos trabalhos, culminando com uma mesa redonda, quando alunos e convidados apresentaram suas visões sobre o Canaã, sob a ótica de cada um, naturalmente tão diversas quanto o romance sugere. Por iniciativa, um grupo de alunos Da Vinci criou um site sobre o romance – leia a matéria Clique aqui para ver matéria “Alunos do Da Vinci montam site sobre Canaã”. .

No volume JURISPRUDÊNCIA MINEIRA diz o Desembargador Luiz Carlos Biasutti: “Conseguimos a cópia do traslado da apelação na Comarca de origem, graças à direção do Colégio Leonardo da Vinci, de Vitória, E. S. Tal documento faz parte do acervo da Memória do Judiciário do TJMG, e é dedicada ao Des. Hélio Costa, um dos apaixonados pela obra de Graça Aranha.”

Diz o texto do Desembargador, na íntegra:

CENTENÁRIO DE UM ROMANCE SOBRE A JUSTIÇA

A trama do romance Canaã, Graça Aranha colheu na vida local, com os documentos das testemunhas forenses. (Josué Montello). Nos últimos tempos do Império e começo da República, muitos jovens do nordeste vieram para a região sudeste do Brasil, onde abraçaram a carreira jurídica e se tornaram juízes ou promotores. Alguns permaneceram na carreira, outros, apenas procuraram melhorar o curriculum vitae para alçar vôos na política, diplomacia ou no mundo das letras. Esta foi a carreira de José Pereira de Graça Aranha, que, aos 22 anos, veio a ser juiz municipal de colonização teuto-brasileira das montanhas centrais do Espírito Santo. Nascido em São Luís do Maranhão em 1868 e formado na Faculdade de Direito do Recife.

Resumo do romance

1- Depois de uma viagem a cavalo, Milkau chega no Porto de Cachoeiro, atual Santa Leopoldina, a fim de começar a vida de colono. Em Santa Leopoldina, próspera cidade comercial, sede da Comarca do Espírito Santo Central, encontra outro companheiro que resolve também ser colono. Ambos dialogam bastante sobre a Europa, o Brasil e a nova colônia. Milkau conta que antes da aventura de Cachoeiro estivera no Oeste de Minas Gerais, em São João del Rei, onde viu o Brasil tradicional, de fé religiosa e de heróis.

2- Resolvem subir as serras de Santa Leopoldina e chegam a Santa Teresa. Admiram o trabalho e a vida na vila. No dia seguinte, uma jovem muito bela mostra a ambos o caminho em direção ao Rio Doce. Milkau e o companheiro descem a serra (de Canaã) cantando as maravilhas da nova terra. É um dos trechos mais belos e poéticos do romance.

3- Recebem o lote e começam o trabalho. Um dia, descobrem que haveria uma grande festa em Jequitibá e resolvem participar do evento. Encontram pastores, autoridades, músicos e o povo em geral. Depois do culto religioso, participam do baile na casa de Jacob Muller. Durante este baile, Milkau conversa um bom tempo com a jovem Maria Perutz. Após os festejos, o retorno para o trabalho na colônia.

4- Meses depois, Milkau vai a Santa Teresa a fim de fazer compras e encontra novamente Maria, grávida, esfarrapada, trabalhando numa pensão por um prato de comida. A infeliz lhe conta que fora desonrada pelo filho de um rico colono do Rio Bonito, com promessa de casamento. Tinha sido expulsa da comunidade e abandonada por todos. Chegou a Santa Teresa, onde tinha conseguido aquele miserável emprego. Milkau resolve levar Maria para sua colônia. Um belo dia, Maria sentindo as dores do parto, caminha pelo pasto e, longe de todos, dá à luz uma criança, que, contudo, é devorada pelos porcos. O assunto rendeu, e as autoridades da Comarca prenderam Maria como criminosa.

5- Milkau observa “a injustiça da administração da justiça” e a pouca vergonha no caso. Maria é seviciada pelos soldados da cadeia. Aproveitando que a guarda dormia bêbada, Milkau tira Maria da cadeia e sobe com a jovem pela serra acima, prometendo uma vida nova, fundada no amor.

O crime conforme o processo

Maria Perutz no romance, Guilhermina Lübke na realidade, era uma jovem de 23 anos, “criada”, ou seja, empregada doméstica em casa de Frederico Küster, no Distrito de Jequitibá. Na madrugada de 3 de agosto de 1889, deu à luz, sem qualquer assistência, uma criança do sexo masculino. Jamais se poderá saber se a criança nasceu viva ou morta, diante da fraqueza das provas existentes nos autos. No romance, Graça Aranha dá-a como nascida viva e morta pelos porcos, na clássica seqüência do Capítulo Nono. Ouvida Guilhermina Lübke como suspeita de infanticídio, declarou, ainda na fase policial, ser “criada”, natural da Alemanha (mais tarde diria ter 23 anos de idade), e informou que “botou o cipó no pescoço da criança a fim de participar à mulher de Küster”, e que “não enterrou o cadáver a boas horas porque tinha temor do dono da casa”.

Quatro dias depois foi concluído o inquérito policial, tendo sido remetido então ao juiz municipal em Vitória, pois ainda não fora criada a Comarca do Cachoeiro. O Juiz, Martins Rodrigues, em 19 do mesmo mês de agosto deu vista do inquérito policial ao promotor Manuel Pedro Vilaboim, que ofereceu denúncia contra Guilhermina Lübke, no dia 2 de outubro seguinte, data em que o mesmo juiz municipal determinou se fizesse sumário de culpa.

Entrementes foi proclamada a República e criada a comarca na antiga colônia. O processo dormiu longo sono cartorário, como que esperando que Graça Aranha entrasse em cena. O processo, que estivera parado por mais de um ano, agora, em um mês e seis dias, apesar de ser de difícil preparo, por causa da barreira lingüística, e numa época em que não havia estradas, viu seu rápido término, ficando pronto para julgamento. Graça Aranha toma as medidas burocráticas para a realização de novo julgamento e lavra seu derradeiro despacho nos autos em 24 de novembro e deixa, como vimos, a comarca. O julgamento se realizou no dia 10 de dezembro seguinte, tendo a ré sido absolvida por seis votos contra um. No dia 17 de fevereiro seguinte, o juiz de direito apelou da decisão para o Superior Tribunal da Relação, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal. Foi confirmada a absolvição.

Somente em 28 de março de 1892 foi determinado se oficiasse ao Secretário de Justiça e Segurança Pública em Vitória, onde se encontrava presa a ré, para que pusessem, imediatamente, em liberdade, isso quase três anos depois de sua prisão.

Considerações finais

Essas explicações sobre o processo criminal que deu origem ao romance Canaã são de autoria do Dr. Renato Costa Pacheco, ex-juiz da Comarca de Santa Leopoldina-ES. O importante é ler o texto do romance, que teve grande repercussão na época.


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