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MPB: A Vida é a arte do Encontro
12/08/2010 · por Paulo de Tarso Rezende Ayub · Tags: Da Vinci, Música


Encontros com a MPB - "A Vida é a arte do Encontro"

A agenda cultural dos sábados à tarde, em Vitória, é carente de opções, exceção feita às sessões de cinema e às peças infantis de teatro. Nesse cenário, é alentadora a iniciativa do Centro Educacional Leonardo da Vinci (em parceria com o Big Beatles), sob a diligente coordenação de Pedro de Alcântara, diretor do Centro Musical Da Vinci, no sentido de fazer aportar, por estas bandas, nomes consagrados da Música Popular Brasileira, a fim de vivenciar interações intimistas com o público, sem limitação de faixa etária.

Tais encontros têm atraído um público eclético, composto por profissionais e alunos da Escola; apreciadores musicais do nosso entorno; representantes de outros Estados, sabedores do evento por intermédio da Mídia local. A mediação inteligente de Edu Henning, o domínio de cena dos convidados e a participação de espectadores que cultuam a boa MPB têm resultado em tardes “cheias de graça”, dosadas pela pitada cultural.

Os encontros com a MPB trazem, em sua concepção/execução, a marca registrada da diversidade e a seleção criteriosa dos músicos que vêm intensificar o contato com seu público (“todo artista tem que ir até onde o povo está”). Durante uma hora de conversa, estes têm partilhado conosco dados de sua trajetória; memórias históricas e artísticas; dinâmica e estaticidade do processo criativo; curiosidades, anseios e nostalgias; além de demonstrarem habilidades e limitações na lida com a palavra, a musicalidade, o estar no mundo, o cotidiano.

Pepeu Gomes conjugou seu virtuosismo como instrumentista (demonstrado na execução de números musicais de alto nível) a um discurso articulado, estabelecendo conexões entre diversos itens de sua biografia.  Resgatou o curioso legado dos Novos Baianos nos tempos do “Acabou Chorare”, demarcados pela fuga aos padrões e pelo protesto perante o contexto repressor da época, o que estimulou o potencial criativo e produtivo do grupo; partilhou a cena familiar que o inspirou a produzir a célebre canção “Masculino e Feminino” (o enfrentamento da menarca pela primeira filha, sob o olhar compreensivo e acolhedor do pai “atabalhoado”); tripudiou com os nomes irreverentes atribuídos às filhas de sua relação com Baby Consuelo (hoje, Baby do Brasil); deu-nos a conhecer  seu traço de colecionador compulsivo de instrumentos e sua postura de abandono das drogas, desmistificando imagens associadas à sua polêmica figura. Espirituoso e acolhedor, demonstrou inteligência aguçada e amplo domínio de seu ofício e estilo.



Paulinho Moska compareceu mais para falar do que para tocar, adepto que é da linguagem em suas nuances e potencialidades. Explicou-nos a origem de seu nome artístico e a inspiração para sua trajetória, pautada na analogia com a mosca, em sua vida efêmera, olhar caleidoscópico e dificuldade em definir com precisão seu alvo, o que não significa que deixe de alcançá-lo. Mostrou-se um adepto das generalidades (e não das especificidades), o que lhe permite transitar pela Música, Poesia, Fotografia e Teatro, sem o compromisso da excelência em todas as frentes que abraça. Tratou do processo de composição em sua riqueza e dilemas, desmistificando a visão do artista como uma pessoa iluminada ou dada a rompantes de produção (o público deleitou-se com as explicações mais inusitadas associadas ao processo criativo, numa tentativa de enquadrar aptidões que escapam ao domínio racional). Retratou a veia repressora da religiosidade, quando encarada como dogma, celebrando o amor como força vital das relações humanas. O público presente foi brindado com uma reflexão filosófica em profundidade, pontuada pela execução de canções de seu repertório que deixam transparecer o olhar multifacetado do compositor para a realidade. Os pontos altos do memorável momento com Paulinho Moska foram a demonstração por ele feita no tocante à musicalidade da fala, melodiando frases cotidianas, e o compartilhamento de sua veia pesquisadora, refletida nas diversas coleções que mantém, por se interessar pela “face oculta” das coisas.



O terceiro visitante, Beto Guedes, entrou no palco tímido como de costume e deixou evidente sua dificuldade em lidar com a palavra, o que o levou a dedicar-se a outras causas, geralmente voltadas para o domínio instrumental e a habilidade motora - a marcenaria é uma paixão e desembocou num desafio inconcluído de montar um avião. Sua pouca aptidão para expressar-se (conforme ele mesmo pontuou em diversos momentos) não o impediu de revisitar as vivências do “Clube da Esquina” e suas contribuições para um novo estilo de fazer música; de expressar a nostalgia em relação ao velho LP, com suas dimensões acentuadas e capas estéticas, ressentindo-se de sua substituição pelos CD’s, tão impessoais e pulverizados; de demonstrar a influência dos Beatles sobre sua formação musical, apesar de um estranhamento inicial quanto ao seu estilo dos meninos de Liverpool. O público entoou com ele o clássico “Quando te vi” e pontuou o reconhecimento que lhe é dirigido por representantes da cena cultural nacional, ao que Beto Guedes contra-argumentou que o artista, mais do que qualquer qualificação que lhe atribuam, é resultante da receptividade e do afeto do público que o cultua.


 

Muitas das pessoas presentes aos “Encontros com a MPB” têm comparecido também às apresentações musicais noturnas propiciadas por esses músicos no Spírito Jazz, quando compartilham com o Big Beatles a paixão pela banda inglesa e seu legado sobre a história musical de cada um. Mas tem sido nos encontros realizados na Escola que o público pode vivenciar uma real proximidade com o artista, enxergando sua face humanizada, (re) conhecendo-o em suas potências e fragilidades, surpreendo-se com seus perfis multifacetados, que por vezes chegam até nós apenas pela metade, via mercado/Mídia. Que venham então os próximos convidados para acalentar nossas tardes de sábado com momentos que deixem nossa alma leve e sensibilidade musical mais aguçada.

O próximo encontro acontece no dia 14 de agosto de 2010, com a cantora Fernanda Porto.




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