Quando não nos limitamos à face aparente das coisas, o inesperado pode acontecer. Eis a sensação que resultou de nossa visita sociopedagógica à Casa dos Figureiros, em Taubaté, ao final de outubro/2010. Mesmo já tendo sido vivenciada em tantas outras ocasiões da viagem acadêmica com os quintos anos do Fundamental para Campos do Jordão/Taubaté, sempre traz um quê de surpresa.
Nesse espaço cultural, o barro é trabalhado como matéria-prima para desenvolver a habilidade tátil e o sentimento de artesãos que praticam a evolução das técnicas primitivas, reproduzindo não apenas figuras religiosas em presépios (tradição dos figureiros), mas também peças do folclore e cultura locais. Ênfase seja dada à simbologia do pavão, que de modismo europeu adaptado à Taubaté pródiga em fazendeiros e barões passou a ave-símbolo do artesanato, pela imaginação potente dos artistas.
Pavão misterioso: pássaro formoso
Já retratamos bastante o trabalho prestigioso e considerado dos figureiros, que os faz figurar como uma referência do artesanato nacional. Mas nosso foco, nesta matéria, é divulgar o trabalho do artesão Décio, que sempre contextualiza nosso grupo em viagem sobre o histórico do empreendimento e os motivos estéticos e motivações afetivas dos artesãos/artistas do local. Além dessa faceta pedagógica (já nossa conhecida), o parceiro de tantos anos revela-se também um empreendedor em matéria de trabalhos socioculturais.
Décio em ação com nosos alunos em viagem: a contextualização necessária para fruição da cultura
Em anos anteriores, Décio já nos havia contado sobre um trabalho por ele desenvolvido com deficientes visuais, tendo nos presenteado com uma peça “dinossauro”, modelada por um dos artesãos em formação. No contato deste ano, pudemos conhecer um pouco mais sobre o trabalho que ele desenvolve há anos com deficientes visuais do Instituto São Rafael, em Taubaté.
Lendo matérias de jornal ou assistindo a DVDs que documentam essa trajetória, emociona ouvir depoimentos de pessoas que manifestam o quanto construir esculturas de argila deu nova luz a suas vidas, a despeito da perda visual.
A esta forma de inclusão que, muito além do voluntariado, perpassa pela produção cultural e gera uma sensação de pertencimento no universo das imagens, Décio qualifica como “arte sensorial”. Muito próxima da experiência do Da Vinci no projeto “Arte sem Limites”, em que pessoas com limitações visuais ou motoras dão vazão à habilidade musical e à arte da declamação, compondo um trabalho reconhecido pela produção, muito mais que pela inclusão.
Partindo da ideia da criação do universo (teoria do big-bang), um dos artesãos ensinados por Décio, de nome Adriano, criou pedras ilustrativas em torno do fenômeno. E Décio vem espalhando as pedras de Adriano (o Da Vinci foi presenteado com alguns exemplares) como uma forma de disseminar a arte sensorial de alguém que, mesmo não tendo todos os sentidos aguçados, produz sua arte para sentir-se ativo, realizador.
Décio, artista plástico, está cursando pedagogia. Como que para oficializar uma vocação que já exerce naturalmente: ensinador, propiciador de sentimentos.
Trabalho desenvolvido por Décio com deficientes visuais
Artesanato de Décio
Arte sensorial: apontando caminhos, moldando destinos.
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