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A leitura escolarizada
09/12/2010 · por Paulo de Tarso Rezende Ayub · Tags: Da Vinci


 A leitura escolarizada: o pragmatismo do conhecimento

    O projeto de 3ª Nota do 3º período realizado na disciplina de Português, com as primeiras séries do Ensino Médio, teve foco na leitura escolarizada, a qual, diferentemente da leitura por fruição, deve tornar pública a apropriação de conhecimentos, procedimentos de leitura e percepções leitoras, por parte dos alunos envolvidos. Na Escola, deve-se ler prioritariamente para “aprender a aprender” e em seguida “exercitar o ensinar”, gerando trocas de informações/impressões, debates e ampliações de pensamento, entre os pares.

Há livros que, se não trabalhados pela Escola, dificilmente chegarão ao conhecimento de leitores juvenis, a exemplo dos clássicos literários ou das produções que extrapolam o apelo ao consumo do mercado editorial. Por isso, a preocupação do projeto em trazer um diferencial na seleção das obras, contemplando núcleos temáticos e eixos normalmente não priorizados por indivíduos nesta faixa etária: o jornalismo vivencial ou investigativo; os regimes ditatoriais em suas múltiplas faces; o mundo muçulmano e as relações entre Oriente e Ocidente; a ficção histórica sobre épocas e fatos instigantes; a multinarrativa; obras capixabas ou nacionais (de circulação restrita); livros filosóficos sobre religião, amor, família. Foi aberta também a possibilidade de os alunos indicarem leituras que estabelecessem conexão com os focos selecionados, desde que argumentassem com propriedade sobre os impactos da obra indicada para a formação de competência leitora e ampliação do repertório cultural. A lista trazida pelo professor foi enriquecida pelo protagonismo exercido por alunos com perfil leitor.


   
Cada grupo-classe foi dividido em duplas (ou no máximo trios) para fazerem uma leitura e socialização da obra que lhes competisse, perante os demais colegas. Cada apresentação consistiria em uma explanação oral (de livre configuração) e uma produção escrita, neste caso podendo-se optar pela resenha, carta argumentativa ao autor ou artigo de opinião, servindo-se da obra lida para ampliação do potencial argumentativo em torno do tema escolhido.
   
Durante praticamente todo o período, os alunos fizeram uma imersão na leitura e vivenciaram coletivamente um grande círculo de reflexão e pensamento, em torno de vinte obras de diferentes gêneros, nenhuma abordada em vestibular, mas sempre presentes na lista dos mais vendidos ou nas indicações de leitores antenados e sensíveis.

As individualidades, potencialidades e limitações na leitura apreciativa/crítica e expressão de ideias ficaram patentes na fase das apresentações orais, descortinando um painel de iniciativas diversificadas de socialização das leituras feitas. Foi interessante notar uma maior ênfase para a fala livre (e o exercício da oralidade) e a dramatização de cenas/monólogos do que para o uso de recursos tecnológicos, estes geralmente atuando como pano de fundo às reflexões leitoras. Também foi instigante ver se alternarem momentos de ricos debates com outros de silenciamento, em que a reflexão falava mais alto do que a verborragia. As apresentações que mais sensibilizaram os colegas foram as que revelaram o olhar analítico do leitor e seu envolvimento com os modos de narrar e as tramas, e isto independentemente de se trazerem ou não recursos digitais ou vídeos no youtube relacionados aos temas/tramas.

O acolhimento dos grupos a cada dupla (ou trio) que se apresentava, independentemente das potencialidades e limitações reveladas, foi o ponto alto do projeto e a confirmação de que a sala de aula permanece como espaço fundamental para desenvolver respeito mútuo e espírito de colaboração. Para os que se apresentavam, o desafio de conciliar clareza de expressão, domínio de conteúdo, linguagem precisa e recursos/estratégias criativos. Para os que recebiam, o compromisso de ampliar conhecimentos e percepções, praticando o dom da escuta e a habilidade de estabelecer relações.



Em algumas apresentações, o professor orientou os alunos para a necessidade de diversificar os focos de análise em torno das obras lidas (superando a submissão da mulher no mundo muçulmano ou o sofrimento pessoal imposto pelo nazismo, por exemplo) e de estarem mais atentos para o estilo de escrita e as artimanhas literárias praticados em obras que, mesmo contendo grande densidade temática, arrebatam o leitor pela liberdade criadora e apuro na expressão. Os alunos tendem a priorizar o conteúdo sobre a forma e precisam ser conscientizados para as nuances da linguagem, em obras de diferentes gêneros. Também devem ser estimulados à leitura crítica e ao direito de manifestar diferentes visões frente aos livros lidos, desde que mantenham o compromisso de chegar até o final da leitura  e busquem construir argumentação fundamentada.

Mesmo que cada dupla/trio tivesse o compromisso de ler “formalmente” apenas um livro, o projeto propiciou que os alunos tivessem contato com muitas obras e desenvolvessem um desejo de ampliação de leitura. Com efeito, muitos participantes do projeto envolveram-se numa ciranda de leituras, movendo-se pela disposição individual ou pelo estímulo à leitura dado pelo outro. Alunos que alegavam ler pouco passaram a incorporar livros ao seu cotidiano; alunos que já leram muito e haviam dado uma “parada” reincorporaram o hábito; alunos que ainda não sentem a necessidade de ler constantemente pelo menos se incomodando com essa atitude ...
À medida que o projeto se desenvolveu, alunos e professores foram ampliando as conexões entre as obras trabalhadas, valendo a pena relembrar alguns pontos de contato construídos coletivamente:
a)    a denúncia em relação ao poder paralelo exercido pelo narcotráfico, apto a moldar e destruir destinos, como se vê em “Narcoditadura” e “Falcão, meninos do tráfico”, leituras imprescindíveis para compreender o atual momento de enfrentamento do tráfico no Rio de Janeiro;
b)    o poder de reinvenção da Literatura quando se aborda um tema comum, mas buscando forma e arranjo originais de cada escritor, o que fica nítido em “A menina que roubava livros”, ou “O menino do pijama Listrado” (o Nazismo revisitado por olhos de diferentes narradores, da mística Morte à pureza infantil);
c)    a parcialidade da literatura vivencial, em que a complexidade das relações humanas é analisada sob o ponto de vista de quem narra, a exemplo do que ocorre em “O diário de Anne Frank”, “O livreiro de Cabul”, “Comer, Rezar, Amar” e mesmo em “Clube do Filme”;
d)    a cientificidade da literatura que adentra pela ficção histórica, trazendo experiências relevantes de pesquisa e resgate em torno de épocas/personagens instigantes para a experiência humana, tal como acontece em “Os cisnes de Leonardo”,  “A menina que roubava livros” ou em “As memórias do livro”;
e)    a mistura de fios e focos narrativos, numa verdadeira trapaça com a linguagem e o estilo, que une as narrativas multifacetadas de “A sombra do vento” e “A menina que roubava livros”;
f)    a narrativa autobiográfica de pessoas que tiveram seus destinos modificados por regimes ditatoriais, ao ponto de produzirem obras em que se mesclam registro histórico, catarse e denúncia, tais como “À espera de neve em Havana” e “Adeus, China’.
g)    o vazio existencial e a mistura entre fantasia e realidade que acomete o cotidiano de personagens complexas, como se torna patente na trajetória das protagonistas de “Kitty aos 22: divertimento” e “A menina que não sabia ler” .

Uma outra contribuição do processo foi a compreensão aprofundada das partes constitutivas de um livro, como forma de interação com o leitor, desde o prefácio/prólogo até o posfácio e os agradecimentos, passando ainda pela capa, contracapa, orelha e eventualmente epígrafes/dedicatórias. Os alunos enxergaram a riqueza que demarca a editoração de uma obra, conhecendo de perto diferentes formas de lidar com esses componentes, surpreendendo-se com as epígrafes de “A cabana”, o prefácio revelador de “À espera de neve em Havana” e “Kitty aos 22: divertimento” ou com os apelos do mercado editorial demonstrados na transformação das capas de obras como “Comer, rezar, amar” ou “O guardião de memórias” em peças publicitárias; tudo a exigir senso estético e análise crítica por parte do leitor.

A última etapa do processo foi a produção escrita de textos, um farto material para análise crítica e verificação dos resultados obtidos com o projeto. Fazendo uma avaliação panorâmica das produções escritas, vale destacar que os textos revelam uma oscilação comum na expressão escrita, indo da excelência à simplificação, e também no tocante ao aprofundamento ou redução frente às apresentações orais e interações face a face. Típico das diferenças entre oralidade e escrita; entre comunicar dramatizando ou escrevendo; entre contar com recursos adicionais para enriquecer a fala e dispor apenas da palavra escrita como instrumento comunicativo.

Algumas produções escritas revelaram confusão entre gêneros (cartas argumentativas com estrutura mais próxima de uma resenha); outras deixaram de se apropriar do livro para fins de demonstração do repertório cultural adquirido; outras ainda se limitaram à síntese da história, não exercendo o olhar crítico ou o senso estético mediante análise de recursos literários e estilísticos; outras ainda foram feitas “às pressas”, sem investimento na qualidade. Tudo totalmente compreensível para a faixa etária e bem coerente com a diversidade própria do contexto escolar, mas que deve ser pontuado perante os alunos, para que convivam naturalmente com os dilemas e dificuldades da escrita vista como processo e tendam a buscar uma maior qualidade de suas produções.

A fim de que as marcas do projeto se tornem perenes pela escrita, o professor fez uma seleção dos textos escritos considerados mais consistentes, para leitura dos interessados e curiosos. Chama atenção a profundidade de algumas análises feitas e o enriquecimento cultural trazido via Literatura, o que recomenda a conveniência de intensificar práticas que atribuam à escola a missão de culturalização que lhe é inerente e contribuam para o resgate da leitura escolarizada como instrumento de formação de homens, ampliação de saberes/valores e desenvolvimento de habilidades para estar no mundo, sentindo-se parte integrante dele. A leitura e a escrita exercendo a função social que aproxima os alunos da realidade, se não para modificá-la, ao menos para inquietar-se com sua complexidade.

     

   

      





Arquivos para download
Artigo_de_Opinião_A_Cabana.pdf (27 Kb)
Artigo_de_Opinião_O_guardião_de_memórias.pdf (32 Kb)
Carta_Argumentativa_A_menina_que_roubava_livros.pdf (22 Kb)
Carta_Argumentativa_Comer_Rezar_Amar.pdf (28 Kb)
Resenha_Crítica_A_cabana.pdf (28 Kb)
Resenha_Crítica_A_menina_que_não_sabia_ler.pdf (33 Kb)
Resenha_Crítica_A_sombra_do_vento_(1).pdf (28 Kb)
Resenha_Crítica_A_sombra_do_vento_(2).pdf (30 Kb)
Resenha_Crítica_Me_leva,_Brasil_(1).pdf (39 Kb)
Resenha_Crítica_Me_leva,_Brasil_(2).pdf (31 Kb)
Resenha_Crítica_Narcoditadura.pdf (27 Kb)
Resenha_Crítica_O_diário_de_Anne_Frank.pdf (38 Kb)


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